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Jornada del Muerto
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"Cada vez que o reino do humano me parece condenado ao peso, digo para mim mesmo que, à maneira de Perseu, eu devia voar para outro espaço. Não se trata absolutamente de fuga para o sonho ou o irracional. Quero dizer que preciso mudar de ponto de observação, que preciso considerar o mundo sob uma outra ótica, outra lógica, outros meios de conhecimento e controle" (Ítalo Calvino - Seis Propostas para o próximo milênio)
JORNADA DEL MUERTO é uma obra que reflete sobre a necessidade de mudanças subjetivas diante das urgências do mundo, adotando a perspectiva das plantas.
Em novembro de 2023, viajei ao Novo México (EUA) para explorar a região Jornada del Muerto e o White Sands Park, onde se encontram o Trinity Site, local da primeira explosão nuclear da história, em 1945, e a maior instalação militar dos EUA, o White Sands Missile Range (WSMR).
Esse cenário de complexidade histórica e ambiental serviu como pano de fundo para retratos de plantas nativas, como a Yucca Elata e a Sporobolus Airoides, que sobrevivem em um ambiente hostil, desafiando a delicadeza aparente de suas formas.
A obra investiga como a resiliência não ignora adversidades, mas encontra leveza mesmo em situações inóspitas, inspirando-se na inteligência e filosofia vegetal e na leveza descrita por Ítalo Calvino.
Após fotografar as plantas em White Sands Park, fotografei imagens em vídeo da explosão atômica, recriando sua visualidade como radiografias, que passaram a dialogar com as formas das plantas e os contornos do território em que elas estão inseridas. Em seguida, desenhei essas imagens com carvão e as imprimi em acetato, criando sobreposições visuais que conectam as plantas nativas, a explosão e o território, traduzindo destruição em processos que tensionam renovação e resiliência, tanto no âmbito simbólico quanto no natural.
Nesse contexto, marcado pela interseção entre paisagem, território e política, Jornada del Muerto propõe uma reflexão crítica sobre a relação entre adversidade e regeneração. A obra sugere um engajamento profundo com a realidade, destacando a importância das conexões e interdependências em um mundo atravessado por crises de toda ordem – ambientais, sociais, políticas e humanas.
Inspirado pelo reino vegetal, o trabalho convida a repensar como a diversidade e as interdependências são essenciais para a sobrevivência e como o ser humano, ao se distanciar desses princípios, perde oportunidades de regeneração e equilíbrio coletivo.
(Jornada del Muerto - é uma região nomeada pelos colonos espanhóis no século XVI, fazia parte de uma antiga rede comercial e ganhou a reputação de "um caminho que não leva a lugar nenhum" devido às adversidades da travessia)